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A Ciência do Brincar Livre “Mão na Massa”:

Por Carla Cruz, pesquisadora das infâncias, especialista em educação bilíngue e Coordenadora Pedagógica da Maple Bear Penedo. Na educação infantil, exist...

A Ciência do Brincar Livre “Mão na Massa”:
A Ciência do Brincar Livre “Mão na Massa”: (Foto: Reprodução)

Por Carla Cruz, pesquisadora das infâncias, especialista em educação bilíngue e Coordenadora Pedagógica da Maple Bear Penedo. Na educação infantil, existe um princípio que sempre reafirmo: quando as crianças colocam as mãos na experiência, o cérebro inteiro se coloca em movimento. Não é metáfora — é neurociência aplicada à prática pedagógica. Ao longo da minha trajetória como pesquisadora das infâncias e especialista em desenvolvimento infantil e educação bilíngue, com anos de experiência na rede canadense de escolas Maple Bear, observo diariamente como metodologias baseadas no brincar livre, loose parts (materiais não estruturados) e outdoor learning (temos uma floresta na nossa escola) constroem aprendizagens profundas, sensíveis e duradouras, pois o significado de tudo vai se construindo no ritmo da criança, dando tempo do processamento, da acomodação emocional e do aprimoramento de habilidades para o uso na vida real. A Maple Bear Penedo tem integrado esses pilares com intencionalidade: experiência concreta, liberdade com propósito e natureza como sala de aula. É assim que honramos o desenvolvimento integral e bilíngue das crianças — pelo corpo, pela curiosidade e pela ação. A Ciência do Brincar Livre “Mão na Massa” Foto: Divulgação / Maple Bear Penedo Segundo Aline De Chiara, professora de Educação Física na Maple Bear Penedo, quando a criança vive o movimento em diferentes espaços, ela não só brinca: ela floresce, encontra confiança, ganha autonomia e descobre que o corpo é sua primeira forma de aprender. Já o professor Rodrigo Vieira, também da Maple Bear Penedo, reforça que oferecer diversos ambientes de movimento é permitir que a criança sinta, experimente, se arrisque e cresça, é dar ao corpo a chance de ensinar aquilo que nenhuma sala de aula consegue sozinha. Mãos que Sentem, Cérebros que Aprendem Mais de um terço do mapa motor do cérebro está dedicado às mãos e aos dedos. Cada mão é um território rico em terminações nervosas e receptores proprioceptivos — estruturas que enviam ao cérebro informações essenciais sobre pressão, peso, textura e resistência. Cada pegar, apertar, raspar, empurrar ou torcer envia uma torrente de dados para áreas neurais diretamente envolvidas com: • coordenação e planejamento motor, • atenção e foco, • autorregulação emocional, • linguagem, • memória de trabalho. As mãos moldam o cérebro — literalmente. E por isso, brincar livre é uma necessidade biológica, não um luxo pedagógico. A Ciência do Brincar Livre “Mão na Massa” Foto: Divulgação / Maple Bear Penedo Como o Corpo Conecta o Cérebro Imagine o cérebro de uma criança como argila fresca, maleável e cheio de potencial, que se molda com um pouco de água. Essa "água" representa as aprendizagens, experiências corporais e intervenções intencionais que, quando oferecidas precocemente, moldam o desenvolvimento de forma profunda e duradoura. "A aprendizagem está, assim, diretamente associada ao fenômeno denominado neuroplasticidade, capacidade que o cérebro humano tem de '[...] fazer e desfazer ligações entre os neurônios [as sinapses] como consequência das interações constantes com o ambiente externo e interno do corpo.' (Cosenza e Guerra, 2011, p. 36) Essa compreensão dialoga diretamente com o que observamos no cotidiano das infâncias. Quando uma criança empurra um tronco, carrega água, escala uma árvore ou amassa argila, ela está realizando muito mais do que uma ação física. Ela está conectando sistemas sensoriais e motores que servem de base para pensar, comunicar e lembrar. O movimento intencional ativa: • o hipocampo, responsável pela memória e pelo mapeamento espacial; • o córtex pré-frontal, sede das funções executivas, da tomada de decisão e do raciocínio. Quando o corpo se move, essas regiões trabalham de forma integrada, construindo redes neurais mais fortes e eficientes. É por isso que crianças que aprendem com o corpo tendem a apresentar maior capacidade de foco, flexibilidade cognitiva e resolução de problemas. O corpo impulsiona o cérebro, e o cérebro, fortalecido, amplia o pensamento, a linguagem e a autonomia. A Ciência do Brincar Livre “Mão na Massa” Foto: Divulgação / Maple Bear Penedo Exploração Sensorial: A Porta de Entrada para a Alfabetização e a Matemática Na Maple Bear, o desenvolvimento bilíngue é sustentado pela experiência concreta. Isso não é acidental: a aprendizagem de uma segunda língua depende de forte desenvolvimento sensório-motor, que por sua vez sustenta: • percepção fonológica, • memória auditiva, • organização espacial, • sequenciação, • atenção compartilhada. Ao integrar loose parts e propostas sensoriais em ambas as línguas, oferecemos às crianças condições para construir significados de dentro para fora. Não trabalhamos com abstrações vazias — trabalhamos com corpo, ação e linguagem organicamente entrelaçados. Brincadeira de Verdade, Entrada de Verdade Experiências como: • amassar barro, • equilibrar-se em troncos, • construir com pedras, • criar trilhas d’água, • cavar, empilhar, pendurar-se, oferecem ao cérebro informações sobre peso, equilíbrio, resistência, coordenação bilateral e ritmo. Esse retorno sensorial organiza o sistema nervoso e apoia diretamente a regulação emocional. O trabalho pesado proprioceptivo — empurrar, puxar, carregar, cavar — reduz cortisol e ativa o sistema calmante natural do corpo. É brincadeira que cura, regula e integra. A Ciência do Brincar Livre “Mão na Massa” Foto: Divulgação / Maple Bear Penedo O Risco do Movimento Sem Significado Deslizar o dedo na tela não é equivalente ao uso das mãos no mundo real. O toque digital: • oferece pouco ou nenhum feedback proprioceptivo, • não envolve resistência, textura nem peso, • não ativa plenamente os sistemas sensório-motores, • não produz integração neural profunda. Pesquisas atuais mostram que maior exposição a telas está associada a: • menor ativação de áreas sensório-motoras, • menor ativação de áreas de linguagem, • conexões mais fracas na substância branca — estrutura-chave para foco e autorregulação. Movimentos repetitivos e bidimensionais achatam o repertório sensorial, limitam o planejamento motor e embotam justamente os circuitos que sustentam a atenção profunda. Quando as mãos deixam de sentir, o cérebro deixa de integrar. A Ciência do Brincar Livre “Mão na Massa” Foto: Divulgação / Maple Bear Penedo Por Que Isso Importa na Educação Bilíngue e na Maple Bear? Porque ensinar em duas línguas é, antes de tudo, ensinar o cérebro a organizar o mundo de múltiplas maneiras. Para isso, ele precisa estar integrado: sensorialmente, emocionalmente e motoramente. Brincar com as mãos desenvolve: • a arquitetura cerebral, • o equilíbrio emocional, • as bases da alfabetização, • a função executiva, • a linguagem — em qualquer idioma. Competência motora precoce prediz habilidades posteriores de leitura e matemática, não por meio de fichas, mas pelo movimento que organiza o cérebro para pensar. A criança que sobe, experimenta, manipula, pergunta, combina e recria é a criança que aprende a aprender. Conclusão: Dar às Crianças o Mundo nas Mãos Quando entregamos às crianças materiais que: • se movem, • oferecem resistência, • respondem às ações, • convidam à curiosidade, Estamos oferecendo ferramentas reais para construir compreensão, autonomia e pensamento profundo. O brincar livre “mão na massa” faz parte de abordagens e metodologias de aprendizagem, mas também é uma filosofia: a crença de que a criança aprende inteira — corpo, mente, emoção, natureza e linguagem em fluxo permanente. As mãos moldam o cérebro. E o brincar molda o futuro.

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