A geração sem céu: a infância que perdeu o direito à natureza
Pesquisas da ONU, UNESCO e universidades de ponta como Harvard e Stanford revelam uma crise silenciosa que atinge milhões de crianças. O chamado déficit de n...
Pesquisas da ONU, UNESCO e universidades de ponta como Harvard e Stanford revelam uma crise silenciosa que atinge milhões de crianças. O chamado déficit de natureza está afetando a saúde mental, o aprendizado e o futuro da juventude. A geração sem céu: a infância que perdeu o direito à natureza Foto/Divulgação: Maple Bear Penedo Muitas crianças começam o dia apressadas por ruas de concreto, olhos baixos, fones de ouvido, mochilas pesadas. Poucas vêem árvores no caminho. Poucas tocam a terra. Poucas sobem em uma árvore. O mundo mudou, e a infância também. Em vez de brincadeiras ao ar livre, telas. Em vez de parques, apartamentos. Em vez de liberdade, medo. O resultado começa a aparecer nas estatísticas: aumento de ansiedade, queda de atenção, sedentarismo, obesidade infantil e declínio de habilidades cognitivas e sociais. O nome disso tem sido chamado por especialistas de “déficit de natureza”, e pode ser um dos maiores desafios de saúde pública e educacional do século XXI. A geração sem céu: a infância que perdeu o direito à natureza Foto/Divulgação: Maple Bear Penedo Quando brincar virou luxo A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança afirma que toda criança tem o direito de brincar e de crescer em contato com a natureza. No entanto, segundo o Comitê dos Direitos da Criança da ONU, “a falta de acesso a espaços naturais e a baixa valorização do brincar ao ar livre comprometem o desenvolvimento físico, emocional e social das crianças” (Comentário Geral nº 17, ONU, 2013). A urbanização acelerada, somada à hiperconectividade digital, vem limitando essas experiências. De acordo com a Natural Learning Initiative, “a redução do acesso a ambientes verdes e experiências físicas e lúdicas ao ar livre eleva riscos para a saúde mental e aprendizagem” (citado no estudo do NCPI, 2025). “As crianças, de modo geral, são naturalmente encantadas pela natureza, pelos animais, pela água. Com o tempo, porém, a sociedade foi se afastando desses ambientes — e as crianças, inevitavelmente, também. Resgatar esse contato, ‘desemparedar’ nossas crianças, é uma experiência profundamente recompensadora e inspiradora. Como educadores — e aqui retomo as palavras de Lea Tiriba — precisamos refletir continuamente se estamos favorecendo ou, sem perceber, criando barreiras para a potência de agir das crianças sobre o ambiente que as toca e transforma”, acrescenta Marilize Diniz, diretora pedagógica da Maple Bear Penedo. A geração sem céu: a infância que perdeu o direito à natureza Foto/Divulgação: Maple Bear Penedo A infância que adoece entre muros Pesquisas em neurociência confirmam que o cérebro infantil precisa de estímulos reais e variados para se desenvolver plenamente. Segundo Kolb & Whishaw, autores do livro Neurociência do Comportamento (2002), “ambientes empobrecidos em estímulos naturais conduzem a sérias desvantagens no desenvolvimento cerebral e comportamental”. Essas desvantagens se tornam ainda mais graves quando combinadas à pobreza. Estudos de Campos e Baran mostram que “crianças em ambientes de vulnerabilidade social apresentam atrasos cognitivos e emocionais devido à falta de estímulos adequados, incluindo o contato com a natureza” (Periódicos UEM). O Núcleo Ciência Pela Infância (NCPI), em relatório de 2025, reforça que “ambientes de aprendizagem externos e naturais impactam positivamente o desenvolvimento físico, cognitivo, emocional e social de crianças na primeira infância”. Para o grupo, ampliar o acesso a áreas verdes é essencial “para garantir um desenvolvimento saudável e sustentável, além de mitigar os impactos da crise climática sobre a infância”. A arquiteta Camila Morais, fundadora sócia da Tropicália e mãe na Maple Bear Penedo, também defende a importância dos ambientes integrados a natureza: “Eu sempre pensei o seguinte: a criança é o começo da vida, e a natureza é a essência da existência. Por isso, acredito que ambos precisam estar conectados de forma genuína. Como arquiteta e também como mãe de uma aluna da Maple Bear, vejo diariamente como essa relação com a natureza faz diferença no bem-estar, na curiosidade e no desenvolvimento da minha filha. Na arquitetura, o design biofílico nos permite criar essa conexão ao trazer elementos naturais para dentro da escola, criando espaços que acolhem, inspiram e potencializam a aprendizagem.” A geração sem céu: a infância que perdeu o direito à natureza Foto/Divulgação: Maple Bear Penedo Natureza como política pública A UNESCO e a ONU defendem que combater o déficit de natureza exige “políticas de educação baseadas em práticas como aprendizagem na natureza (nature-based learning) e ecossistemas de aprendizagem conectados ao meio ambiente”. Essas estratégias, segundo os relatórios, melhoram a saúde mental, reduzem o déficit de atenção e aumentam o engajamento escolar. O jornalista Richard Louv, autor do clássico A Última Criança na Natureza, resume: “Há dados impressionantes mostrando que alunos de escolas baseadas no meio ambiente se saem melhor em testes tradicionais e também desenvolvem pensamento crítico e capacidade de resolver problemas” (BBC Brasil, 2016). Em nova análise (2024), Louv reforça que “brincar na natureza aumenta a criatividade, reduz o estresse e melhora a concentração”, fatores determinantes para o sucesso escolar e profissional. A geração sem céu: a infância que perdeu o direito à natureza Foto/Divulgação: Maple Bear Penedo Da Natureza à sala de aula Pesquisas de Harvard e Stanford demonstram que o contato regular com a natureza estimula a plasticidade cerebral, melhorando a memória, a atenção e o aprendizado. “Ambientes enriquecidos, que incluem o contato com a natureza, potencializam o desempenho escolar e o desenvolvimento de habilidades valiosas para o mercado de trabalho”, aponta estudo citado pela iniciativa Criança e Natureza (2024). O psicólogo Marco Aurélio Carvalho, do Instituto Brasileiro de Ecopsicologia, reforça que “a resiliência, o pensamento crítico e a capacidade de resolver problemas são aprimorados pelo contato com a natureza” (entrevista, 2025). A gerente de Conservação do WWF-Brasil, Mariana Napolitano, acrescenta: “Estar perto da natureza melhora o humor, reduz o estresse e aumenta a sensação de calma e felicidade” (WWF, 2023). Mesmo breves períodos — dez minutos por dia — em ambientes verdes já produzem efeitos positivos, segundo estudo publicado na Ecopsychology (2025). A geração sem céu: a infância que perdeu o direito à natureza Foto/Divulgação: Maple Bear Penedo O que dizem os médicos A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e a Academia Médica Brasileira são unânimes: as crianças precisam passar ao menos uma hora por dia ao ar livre. Segundo o pediatra Dr. Daniel Becker, “a natureza é o território essencial da infância — ela relaxa o cérebro, melhora a imunidade e reduz a ansiedade” (Drauzio Varella, 2023). Relatórios da UNIFESP e da Universidade de Brasília apontam que o contato com ambientes naturais reduz a depressão, melhora o foco e aumenta a empatia. “O tempo na natureza é tão poderoso que deveria ser prescrito como remédio”, resume a Sociedade Brasileira de Pediatria (2024). Elaine Moreira, gastroenterologista, pós graduada em Medicina integrativa e mãe na Maple Bear Penedo também defende sobre o tema: “A ausência de Natureza adoece! Nós somos a natureza e o distanciamento físico e mental têm um alto custo. O grounding, o simples ato de aterrar, é um reset natural, que reduz a inflamação crônica e restaura o fluxo energético. Grounding não é misticismo; é biofísica. Aterrar é a terapia mais acessível para a nossa saúde física e mental. Como médica, eu prescrevo: mais pés descalços!” A geração sem céu: a infância que perdeu o direito à natureza Foto/Divulgação: Maple Bear Penedo Reconectar é urgente e possível O autor Richard Louv defende uma equação simples: “Quanto mais tempo passarmos na companhia da tecnologia, mais tempo precisaremos na companhia da natureza.” Empreendedores e educadores brasileiros concordam. A reconexão com o meio ambiente é vista não só como questão de saúde, mas de inovação e liderança. “A sensibilidade para entender o mundo, inovar e enfrentar desafios nasce na infância, e nasce do contato com o ambiente natural”, dizem representantes da Aliança pela Infância (2024). No Sul Fluminense, a Maple Bear Penedo é um exemplo de escola que já entendeu isso. Em meio a árvores e jardins, as crianças aprendem em dois idiomas e exploram a natureza como parte do currículo. O ambiente se torna um educador: cada galho é um laboratório, cada pedra, uma descoberta. “Como pesquisadora das infâncias, vejo no brincar livre ao ar livre não apenas um direito, mas um antídoto ao déficit de natureza que atravessa esta geração. Quando as crianças exploram o vento, a terra e os pássaros que vivem onde nós vivemos — como no projeto ‘Quem Vive Onde Eu Vivo' da Maple Bear Penedo — elas desenvolvem corpo, mente e pertencimento. Afinal, só cuidamos do que conhecemos: cada encontro com a natureza é um convite para formar cidadãos mais sensíveis, curiosos e protetores do mundo que os acolhe”, diz Carla Cruz, coordenadora pedagógica da Educação Infantil na Maple Bear Penedo. Um novo direito humano O déficit de natureza já é reconhecido por cientistas, médicos e educadores como um problema de saúde pública global. Mas também é uma oportunidade: reconstruir o elo entre infância e mundo natural. Como resume o relatório do NCPI (2025): “Colocar a primeira infância no centro do enfrentamento da crise climática é garantir às crianças o direito mais básico de todos — o de crescer sob um céu aberto.”